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Falece Niède Guidon, referência mundial na arqueologia e na história da ocupação das Américas

Falece Niède Guidon, referência mundial na arqueologia e na história da ocupação das Américas

O legado científico e social de Niède Guidon no Parque Nacional Serra da Capivara

A arqueóloga Niède Guidon deixou um legado que transcende gerações e fronteiras. Reconhecida mundialmente por suas descobertas no Parque Nacional Serra da Capivara, no Piauí, a pesquisadora desafiou teorias consolidadas sobre a ocupação das Américas. Seu trabalho incansável não apenas revolucionou a arqueologia, mas também promoveu uma transformação social e econômica em uma das regiões mais pobres do Brasil.

Nascida em Jaú, no interior de São Paulo, Niède Guidon teve seu primeiro contato com a região de São Raimundo Nonato em 1963, quando se deparou com fotos de pinturas rupestres no Museu Paulista da Universidade de São Paulo (USP). Fascinada, decidiu se especializar em Arqueologia Pré-histórica na renomada Sorbonne, na França.

Em 1973, retornou ao Brasil liderando uma missão franco-brasileira que identificou 55 sítios arqueológicos na região. A expedição, financiada pelo Centro Nacional de Pesquisa Científica da França (CNRS), foi o pontapé inicial de uma das maiores revoluções na pré-história das Américas.

Niede Guidon
Falece Niède Guidon, referência mundial na arqueologia e na história da ocupação das Américas 3

As descobertas que mudaram a história das Américas

Em 1979, foi criado o Parque Nacional Serra da Capivara, e, sob a liderança de Guidon, o parque recebeu o título de Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco em 1991. Mais de 800 sítios arqueológicos e 35 mil pinturas rupestres foram catalogados, consolidando a importância científica do local.

Entretanto, foi no sítio arqueológico da Pedra Furada que Niède abalou a arqueologia tradicional. Enquanto a teoria de Clóvis defendia que os primeiros humanos chegaram às Américas há cerca de 12 mil anos pelo Estreito de Bering, as escavações da pesquisadora revelaram ferramentas de pedra e vestígios de fogueiras datados de até 32 mil anos — e, em algumas interpretações, podendo chegar a 100 mil anos.

A hipótese de Guidon, inicialmente recebida com ceticismo, ganhou força em 2006, quando o arqueólogo francês Eric Boëda confirmou a autenticidade dos artefatos encontrados. Sua teoria sugere que os primeiros habitantes poderiam ter vindo diretamente da África, atravessando o Atlântico, o que até hoje divide especialistas, mas sem dúvida redefiniu o debate sobre o povoamento do continente americano.

Mais do que ciência: transformação social no sertão

O trabalho de Niède Guidon não ficou restrito à arqueologia. Em 1986, ela fundou a Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM), que se tornou uma referência na preservação do parque, mas também na promoção da educação e do desenvolvimento econômico da região.

Sob sua liderança, foram construídas escolas, postos de saúde, e até uma fábrica de cerâmica, que hoje exporta peças e tem linha exclusiva em uma famosa rede de móveis. Além disso, moradores foram capacitados como guias turísticos e “guardiões” do parque, enquanto crianças passaram a receber ensino integral, com aulas de português, matemática e artes — um modelo pioneiro na região do semiárido.

Guidon também protagonizou uma intensa batalha política para a construção do aeroporto de São Raimundo Nonato, considerado essencial para fomentar o turismo e consolidar o desenvolvimento local.

À frente do seu tempo e exemplo de resistência

Num campo dominado majoritariamente por homens, Niède Guidon enfrentou desafios que iam além da pesquisa científica. Sofreu ameaças, resistência política e superou dramas pessoais, sem jamais abandonar sua missão de preservar a história e transformar vidas.

Sua trajetória serve como inspiração para gerações de mulheres na ciência e demonstra que a pesquisa científica pode ser um poderoso agente de mudança social. Guidon provou que proteger o patrimônio histórico não é apenas preservar o passado, mas também garantir um futuro mais digno e promissor para as comunidades locais.

Um legado imortal para o Brasil e o mundo

Após seis décadas dedicadas à pesquisa e à preservação, Niède Guidon faleceu aos 92 anos, mas deixou um legado que permanece vivo no Parque Nacional Serra da Capivara, nas gerações que formou, nas comunidades que ajudou a desenvolver e na história que ajudou a reescrever.

Seu trabalho continua inspirando arqueólogos, cientistas e defensores do patrimônio cultural em todo o mundo. E sua vida permanece como símbolo de resistência, determinação e amor pela ciência.

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